A Vila (impressões sobre esse filme maravilhoso)

Moradores de uma misteriosa vila tentam isolar-se do mundo real a fim de manter a inocência de seus membros imaculada, além de livrar-se dos sofrimentos inevitáveis de quem vive em grandes cidades expostos a perigos constantemente, evitar a morte e as assombrações de um mundo em mudança frenética. Os habitantes da vila mantêm com grande sacrifício um modo de vida rústico, simples, desprovido de regalias. Um membro em especial é criticado por manter-se calado, quase não fala, em uma cena inusitada um morador o adverte: “Não adianta fugir dos sofrimentos, um dia eles o alcançarão”. O que ele quis dizer é que a perda da inocência é inevitável, a finitude e a morte alcançam mais cedo ou mais tarde a todos. È louvável a vontade de livrar-se do modo de vida contemporâneo e buscar conforto isolando-se. No entanto, a vila é uma mentira mantida por meio do mito criado por seus anciãos que governam a vila com mão de ferro. Mesmo sendo aconchegante viver ali, é claustrofóbico, limitado e ilusório. È como se buscassem o alívio em um local mágico. A pureza é conservada no romance, nas festas, na amizade, mas viver assim é uma fantasia irrealizável. Ao mesmo tempo que conseguem parcialmente manter a vila funcionando como previsto, os habitantes são enganados, ou seja, não sabem que existe um mundo atrás das florestas, temem-na por seus monstros. O medo apodera-se do ambiente e faz aqueles membros os mais covardes. Se não desenvolvemos nossas armas de sobrevivência tornamo-nos facilmente manipuláveis. Simultaneamente ao mundo visivelmente protegido como uma redoma de vidro, o preço é muito alto quando a verdade vem à tona. Viver por meio de subterfúgios como esse acaba criando uma desconfiança generalizada e algo escondido, coisas misteriosas são como mentiras bem contadas mas que limitam a visão. Uma moradora é cega, demonstrando a cegueira de se pensar acima dos poderes do mundo, a cegueira de ter medo do desconhecido, a cegueira de se manter intocável. Os filmes contemporâneos tentam recriar um mundo já extinto nos dando uma grande nostalgia dos tempos remotos, tempos que nem ao menos vivemos, tempos que imaginamos ter sido melhores do que hoje. Como não podemos fugir, ficamos exilados na incomunicabilidade que nossa época cultiva, vivemos como que por um fio já que as instabilidades nos assaltam, a segurança de tempos que nos dão saudade foi assaltada pela liberdade ilimitada que ao oferecer tudo que desejamos nos priva do raciocínio e exageramos na medida, temos saudade do tempo em que o romance entre um homem e uma mulher era sagrado, temos saudade de rituais que talvez nunca existiram mas que certamente davam um significado a mais em existências que não viam sentido. Temos saudade da inocência das crianças que atualmente parecem adultos precoces, temos saudade de quando as conversas não eram competições, onde a paz não era um sentimento raro, a complexidade de nossa época nos mastiga lentamente com doses altas de solidão e se não tivermos cuidado ela nos engolirá sem prévio aviso e nos levará para um tempo que a saudade será nosso único refúgio.
0 Comments:
Postar um comentário
<< Home