Febre

Alguns escritores dizem que a inspiração é diretamente ligada ao estado corporal. Hilda Hilst,por exemplo era levada por uma febre quando escrevia. Parece que todos os escritores, mesmo que pareça uma generalização arbitrária, têm fortes argumentos sobre o seu processo criativo, parece que todos estão em um período em que não apresentam tal febre, parecem isentos de fulgor, parece que a descoloração invadiu suas mentes antes iluminadas por diversas colorações. Esse período angustiante me atacou sem prévio aviso. Na vida, há imprevistos, não é verdade? Ou o imprevisto é a regra? Bem, em todos os momentos em que escrevi, e que gostei do resultado, foram momentos em que meu corpo inclinava-se a esse ato, quase como um formigamento nas pontas dos dedos pedindo o toque nas teclas, nas letras e que aquele instrumento posto na minha frente, aquelas páginas em branco na tela do computador, fossem preenchidos com os mais ocultos mistérios e elocubrações imaginárias possíveis. Me deixava levar pelo contínuo fluxo de consciência que se interpenha aos meus afazeres diários. E esse mesmo fluxo me levava quase que por instinto ao reino das letras e dos sentimentos. Eu, como uma vítima, como uma refém de um sequestrador desconhecido que é o processo criativo que me tomava, que eram minhas indagações irrespondíveis pelo real, que era minha fome de forma e beleza, que era, finalmente, o que nasci para fazer. Os escritores, nas entrevistas, dizem que são levados por uma história ainda não contada, mas que os assombra nos sonhos e pensamentos, a trama dos personagens pede para ser encaixada no mundo real, pede que esse delicioso bocado seja concedido a algum leitor, a alguma alma desprovida de alento, como se aquela história fosse uma missão, e ela, de uma forma ou de outra devesse ser literlmente expurgada da alma do escritor para enfim nascer no mundo.
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