quinta-feira, setembro 07, 2006

Herança Judaica

"Neste fim, nesta morte de Moisés, podemos no entanto sentir um parentesco humano por baixo das enormes diferenças. A descrição do velho ainda vigoroso traz-nos à memória a grandeza antega do Moisés de Miguel Ângelo, de longos braços, costas direitas, olhos de águia, um homem que depois de tantos angustiosos encontros com Deus e de tantas desilusões com o seu povo pôde enfrentar a morte sem pestanejar. Também nós morreremos sem termos terminado aquilo que começamos. Cada um de nós teve na sua vida pelo menos um momento de descoberta, um monte Sinai - uma experiência tão fantástica e sobrenatural que consegue parar o tempo, que consegue de algum modo penetrar através do sujo e barulhento presente, a descoberta que, se a deixarmos, nos transportará pelo resto da vida. Mas como Moisés ou Martin Luther King, embora possamos recordar-nos de "ter estado no cume da Montanha" não entramos na Terra Prometida, apenas a vislumbramos fugazmente. "Nada que valha a pena fazer", escreveu Rein Hold Niebuhr, "pode ser realizado no nosso tempo de vida, portanto temos de ser salvos pela esperança. Nada que seja verdadeiro, belo ou bom, faz completo sentido em qualquer contexto histórico imediato, portanto, temos de ser salvos pela fé. Nada do que fazemos, por mais virtuoso que seja, podemos fazê-lo sozinhos, portanto temos de ser salvos pelo amor. Que a realização é intergeracional pode bem ser a mais profunda das descobertas dos hebreus". (Herança Judaica, Thomas Cahill)

A Insustentável Leveza do Ser de Milan Kundera

" O eterno retorno é uma idéia misteriosa: (...) pensar que um dia tudo vai se repetir tal como foi vivido e que essa repetição ainda vai se repetir indefinidamente! O que significa esse mito insensato? (...) Se cada segundo da nossa vida deve se repetir um número infinito de vezes, estamos pregados na eternidade como Cristo na cruz. Que idéia atroz! No mundo do eterno retorno, cada gesto carrega o peso de uma insustentável leveza. (...) Se o eterno retorno é o mais pesado dos fardos, nossas vidas, sobre esse pano de fundo, podem aparecer em toda sua esplêndida leveza. O mais pesado fardo nos esmaga, nos faz dobrar sob ele, nos esmaga contra o chão. Na poesia amorosa de todos os séculos, porém, a mulher deseja receber o peso do corpo masculino. O fardo mais pesado é, portanto, ao mesmo tempo a imagem da mais intensa realização vital. Quanto mais pesado o fardo, mais próxima da terra está nossa vida, e mais ela é real e verdadeira. Por outro lado, a ausência total de fardo faz com que o ser humano se torne mais leve do que o ar, com que ele voe, se distancie da terra, do ser terrestre, faz com que ele se torne semi-real, que seus movimentos sejam tão livres quanto insignificantes. Então, o que escolher o peso ou a leveza? (...) A contradição pesado-leve é a mais misteriosa e a mais ambígua de todas as contradições." ( Milan Kundera nasceu em Praga, na Tcheco-Eslováquia, em 1929)