Lucian Freud
"O menor acontecimento desenrola-se como um destino, e o próprio destino se desdobra como um tecido, amplo e admirável, em que cada fio, conduzido por mão infinitamente suave é preso e mantido por cem outros. (...) Deixe que os seus julgamentos tenham a sua evolução natural, silenciosa. Não se oponha a esta evolução que, como todo o aperfeiçoamento, deve vir do amâgo do seu ser e não pode suportar coação nem pressa. (...) Espere com humildade e paciência a alvorada de uma nova luz. (...)Ser artista é crescer como a árvore que não apressa a sua seiva e resiste, serena, aos grandes ventos da primavera, sem temer que o verão possa não vir. O verão há de vir. Mas só vem para aqueles que sabem esperar, tão sossegados como se tivessem na frente a eternidade.(...)Se se prender à natureza, ao que nela existe de simples e pequeno, àquilo que quase ninguém observa e que, de repente, se metamorfoseia no infinitamente grande, no incomensurável- se estender o seu amor a tudo que vive- se humildemente tentar ganhar a confiança do que lhe parece mesquinho- então tudo lhe será mais fácil, tudo lhe parecerá mais harmonioso e, por assim dizer, mais repousante. (...) Os seus acontecimentos interiores merecem todo o seu afeto. "(Poemas e Cartas a um Jovem Poeta- Rilke)
Fui à feira do livro, já a terceira vez que compareço ao evento, ficando extasiada com tantos livros baratos. Cada livro para mim é repleto de histórias, nenhum se perde, se o compro, há dentro dele algo que encontro de minha própria tragetória. Viver é buscar suas origens, como Rilke enfatiza em um poema " Caos selvagem, Bosque antiquíssimo". Dentro de cada um de nós há um bosque a ser desvendado, algo infinitamente maior do que o tempo que vivemos, e nem ao menos chegamos a sua essência. Mas a procuramos, ávidos de grandes mistérios. E o sobrenatural como que surge e nos resgata. Algo tão simples, mas que me transporta para um universo tão amplo. O fato de colocar a figura de Lucian Freud é falar um pouco do que me acontece, do que me habita no momento.
"Iniciação"
Quem quer que sejas: deixa tua alcova,
dá qual já sabes tudo que desejas,
Teu lar na tarde, longe, se renova,
quem quer que sejas.
Com teus olhos exaustos, que ainda a custo
entre os gastos umbrais logram passar,
ergues inteira a sombra dum arbusto,
posto ante o céu- esguio, singular.
E tens já pronto o mundo: estranho assim
Como palavra que amadurecesse
no silêncio, e que teu olhar esquece
quando lhe captas o sentido, enfim...
